domingo, 31 de julho de 2011

A ARTE DE TRADUZIR FRANZ KAFKA


O mais importante romance do século 20, Der Prozeβ, começa com uma frase implacável: “Jemand muβte Joseph K. verleumdet haben, denn ohne daβ er etwas Böses getan hätte, wurde er eines Morgens verhaftet”. Para o português, temos uma tradução antiga de Manoel Paulo Ferreira e Syomara Cajado que é assim: “Alguém devia ter contado mentiras a respeito de Joseph K., pois, não tendo feito nada de condenável, uma bela manhã foi preso”. Eu entendo que faltava algo nesta versão, mesmo ela sendo correta: a ausência da insinuação de “Verleumdung“ – calúnia ou difamação, em português. Parece-me que se trata de um dado fundamental para entender o que vem depois. O tradutor Modesto Carone, que se dedicou à tradução da obra kafkiana diretamente do alemão (as anteriores, em geral, eram feitas a partir do original em inglês“...) conseguiu uma solução muito melhor para a frase: “Certamente alguém havia caluniado Joseph K., pois uma manhã ele foi detido sem que tivesse feito mal algum”. Notem que a frase original do escritor tcheco tem três partes separadas por vírgula, que é mantida pela tradução de Ferreira/Cajado. Carone constrói a sua com apenas duas partes. Creio que temos aqui a comprovação que não é a tradução mais fiel que transporta melhor o significado profundo do texto literário.

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